Fundação José Silveira

Alemão do canela

Alemão do canela

  • Editora: Academias de Medicina e letras da Bahia – Salvador- Bahia
  • Publicação:
  • Autor: Prof. José Silveira

Um dia, sem saber porque, vejo-me a re velar coisas da minha vida.. Com vela Acessa, iluminou-se um amontoado de fatos e acontecimentos, que jamais pensei pudesse interessar alguém. O aplauso de muita gente as minhas revelações, ligadas quase todas as existências simples de um simples médico, levou-me a contar um pouco mais. Surgiu, dos escombros esquecidos, o Neto de D. Sinha. Misto de menino inocente, deslumbrado e moço revoltado, destemido, na árdua e nem sempre suave batalha da vida. Deixei de ser o cordeirinho manso, por todos querido e adorado, para me tornar fera acuada e perseguida. Reagi: senão com o urro aterrador dos tigres e leões, com o ronco surdo e as unhas de fora de um felino domesticado. Não me agradavam, evidentemente, os lamentáveis episódios; muito menos a sua gravação em livro; de alguns, terei ate recebido contundente reprovação…

Mas, vestido ou não com a pele de memorialista, meu compromisso sempre foi com a verdade… nada mais que a verdade. Ocultá-los, receando ser mal visto e pior interpretado, seria retirar de tudo que escrevi, sua qualidade maior, senão única de valor: a autenticidade. Para integrar e completar esse triptico de história e estórias desse bahiano, que estudou muito, aprendeu pouco e nunca soube ganhar dinheiro, surge agora o ALEMÃO DO CANELA. Porque o Alemão? Porque do Canela? A explicação é simples… Nos livros citados – todos autobiográficos – escolhi para título uma alcunha que, dessa ou daquela forma, me fora atribuída. No primeiro, aproveitei-me do apelido a mim conferido pela fecunda imaginação de Wilson Lins. No segundo, correspondia à verdade, pois, desse jeito, era conhecido e reconhecido no meu encantado Santo Amaro. ALEMÃO DO CANELA, maneira carinhosa com o que me identificavam os pobres e abandonados indigentes, matriculados do Ambulatório Augusto Vianna, no bairro do Canela, quando, ignorado meu nome exato, procuravam-me identificar com essa expressão. A razão deveria estar em que, sendo eu alto e louro, assíduo e disciplinado, respeitador de horários e cumpridor permanente dos acertos, deveria ser mesmo alemão ou ter descendência germânica, atributos positivos da raça.

Fazendo coro com os humildes clientes e, assim, por pilhéria, repetidamente me tratando, procediam vários colegas, entre os quais o inesquecível Galdino Ribeiro, assistente dedicadíssimo do velho Adeodato; pequenino, quase portátil, habilíssimo ginecologista, que a todos encantava com sua infinita bondade. Como, em verdade, nesse Ambulatório da Faculdade de Medicina, passei, durante mais de vinte anos, os melhores instantes de coleguismo e paz, destoante não me parece recordar um chamamento, que tanto me encantava; menos, é claro, pela vaidade estulta de pertencer a um povo famoso pela sua cultura e modo de viver – ninguém se sente mais brasileiro do que eu – do que por descobrirem, nessa invocação, qualidades das quais sempre me orgulhei. Será, ademais, uma homenagem aos caríssimos amigos e aos anônimos enfermos, que tão alegremente atendi, no longo tempo, em que se plasmou minha formação técnica e se consolidou minha vida profissional.

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